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sábado, 1 de junho de 2013

Karl Marx: Manuscritos Econômico-Filosóficos




Terceiro Manuscrito


Crítica da Filosofia Dialética e Geral de Hegel


(6) Este talvez seja um ponto apropriado a explicar e substanciar o que foi dito, e a tecer certos comentários gerais a respeito da dialética de Hegel, especialmente como se acha exposta na Fenomenologia e na Lógica, e a respeito de sua relação com o moderno movimento crítico.
A crítica alemã moderna tem estado tão preocupada com o passado, e tão tolhida por seu enredamento com o tema, que tinha uma atitude totalmente pouco crítica face aos métodos de crítica e ignorava completamente a pergunta, em parte formal, mas de fato essencial qual nossa posição relativamente à dialética hegeliana? Essa ignorância da relação da crítica moderna com a filosofia geral de Hegel, e em particular com a dialética, era tão grande que críticos como Strauss e Bruno Bauer (o primeiro em todos os seus trabalhos; o último em seu Synoptiker, onde em oposição a Strauss, ele substitui a "autoconsciência" do homem abstrato pela substância da - "natureza abstrata", e mesmo em Das entdeckte Christentum) viram-se, pelo menos implicitamente, presos na armadilha da lógica hegeliana. Assim, por exemplo, em Das entdeckte Christentum, argumenta-se: "Como se a autoconsciência ao postular o mundo, o que é diferente, não se produzisse a si mesma ao produzir seu objeto; pois então ela anula a diferença entre si mesma e o que produziu, já que só tem existência nessa criação e movimento, só tem sua finalidade nesse movimento, etc." Ou então: "Eles (os materialistas franceses) não podiam ver que o movimento do universo só se tornou real e unificado em si mesmo na medida em que é o movimento da autoconsciência." Essas expressões não só não diferem do conceito hegeliano, como o reproduzem textualmente.
(XII) Quão pouco esses autores, ao empreenderem sua crítica (Bauer em seu Synoptiker) se davam conta de sua relação com a dialética de Hegel, e quão pouco essa percepção brotou de sua crítica, é demonstrado por Bauer em seu Gute Sache der Freiheit quando, em vez de responder à pergunta indiscreta feita por Gruppe, "E agora, o que fazer com a lógica?", ele a transfere a futuros críticos.
Agora que Feuerbach, em sua "Thesen" em Anecdotis, e com maior minúcia em sua Philosophie der Zukunft, demoliu o princípio interior da dialética e da filosofia antigas, a "Escola Crítica", que foi incapaz de fazer isso por si mesma, mas viu-o realizado, proclamou-se a crítica pura, decisiva, absoluta e finalmente esclarecida, e em sua soberba espiritual reduziu todo o movimento histórico à relação existente entre ela mesma e o resto do mundo, enquadrado na categoria de a massa". Ela reduziu todas as antíteses dogmáticas a única antítese dogmática entre sua própria sagacidade e a estupidez do mundo, entre o Cristo crítico e a humanidade - a ralé. Em todos os instantes do dia, demonstrou sua própria excelência vis-à-vis a estultícia da massa, e anunciou, finalmente, o juízo final crítico, proclamando estar iminente o dia em que toda a humanidade decaída se reunirá diante dela e será dividida em grupos, a cada um dos quais será entregue o respectivo testimoniu paupertatis (certificado de pobreza). A Escola Critica tornou pública sua superioridade sobre todos os sentimentos humanos e o mundo, acima do qual ela está sentada num trono em sublime solidão, contente de ocasional mente deixar escapar dos lábios o riso dos deuses do Olimpo. Após todas essas momices divertidas do idealismo (do Jovem Hegelianismo) que está expirando sob a forma de crítica, a Escola Crítica ainda nem insinuou até agora ser necessário examinar criticamente sua própria fonte, a dialética de Hegel, nem deu qualquer indicação de sua relação com a dialética de Feuerbach. Esse é um procedimento completamente desprovido de senso crítico.
Feuerbaché a única pessoa que tem uma relação séria e critica com a dialética de Hegel, efetuou descobrimentos verdadeiros nesse campo e, acima de tudo, levou de vencida a velha filosofia. A grandeza do feito de Feuerbach e a modesta simplicidade com que apresenta sua obra ao mundo, contrastam incrivelmente com a conduta de outros:
A grande realização de Feuerbach é:
(1) ter mostrado a filosofia nada mais ser do que a religião trazida para o pensamento e desenvolvida por este, de vendo ser igualmente condenada como outra forma e modo de existência da alienação humana;
(2) ter lançado os fundamentos do materialismo genuíno e da ciência positiva, ao fazer da relação social de "homem com homem" o principio básico de sua teoria;
(3) ter-se oposto à negação da negação que alega ser o positivo absoluto um princípio auto-suficiente, positivamente baseado em si mesmo.
Feuerbach explica a dialética de Hegel e, ao mesmo tempo, justifica a adoção do fenômeno positivo, aquele que é perceptível e indubitável, como ponto de partida, da seguinte maneira: Hegel principia pela alienação da substância (logicamente, pelo infinito, pelo universal abstrato), pela abstração absoluta e fixa; i. é, em linguagem comum, pela religião e pela teologia. Em segundo lugar, cancela o infinito e postula o real, o perceptível, o finito e o particular. (Filosofia, cancelamento da religião e da teologia.) Em terceiro lugar, a seguir revoga o positivo e restabelece a abstração, o infinito. (Restabelecimento da religião e da teologia.)
Destarte, Feuerbach concebe a negação da negação como sendo apenas uma contradição dentro da própria filosofia, que afirma a teologia (transcendência, etc.) após tê-la anulado, e assim a afirma em oposição à filosofia.
Pois o postulado ou auto-afirmação e auto-confirmação implícito na negação da negação é encarado como um postulado ainda incerto, oprimido pelo seu contrário, duvidando de si mesmo e por isso incompleto, não demonstrado por sua própria existência, e implícito. (XIII) O postulado perceptualmente indubitável e alicerçado em si mesmo, opõe-se-lhe diretamente.
Ao conceber a negação da negação, sob o aspecto da relação positiva a ela inerente, como a única verdadeiramente positiva, e sob o aspecto da relação negativa a ela inerente, como o único ato verdadeiro, e que se confirma a si próprio, de todo o ser, Hegel descobriu simplesmente uma expressão abstrata, lógica e especulativa do processo histórico, que ainda não é a verdadeira história do homem como um dado sujeito, mas apenas a história do ato de criação, da gênese do homem.
Explicaremos tanto a forma abstrata desse processo quanto a diferença entre o processo como foi ideado por Hegel e pela crítica moderna, e por Feuerbach em Das Wesen des Christentums; ou melhor, a forma crítica desse processo, ainda tão pouco crítico em Hegel.

Examinemos o sistema de Hegel. É necessário começar pela Fenomenologia, porque aí nasceu a filosofia de Hegel e aí seu segredo tem de ser descoberto. 


Próximo capítulo: Fenomenologia

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