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domingo, 3 de fevereiro de 2013

O Mali pode condicionar África?


 

por: Eugénio Costa Almeida©


Houve um período em que o Continente Africano esteve numa certa estranha acalmia político-militar, só entrecortada com as crises da Costa do Marfim e, do já rotineiro, Congo Democrático. Infelizmente, coisa de pouca duração. Desde que emergiu a chamada Primavera Árabe que o Continente, em particular a parte meridional, está em contínua convulsão. Foi – e é – a Líbia, é o Egipto e, mais recentemente, o Mali.
Na Líbia, como se previa, a queda de Kadhafi não seria sinónimo de paz e evolução político-militar. A situação no país está entrar numa rotina de preocupantes conflitos locais com os principais países ocidentais a mandarem sair os seus cidadãos, nomeadamente, da “pátria” da revolta líbia, Benghazi, em parte devido às ameaças dos grupos fundamentalistas islâmicos do Norte de África, ditos aliados da al-Qaeda.
No Egipto a oposição ao presidente islamita Morsi mantém o país sob um clima de forte tensão devido, segundo aqueles, ao facto dos islamitas da Irmandade Islâmica e de Morsi terem criado uma Constituição que fere os desejos libertadores constitucionalistas dos “fundadores” da alforria da Praça Tahrir, ou seja, igualdade entre os Povos e entre os Homens e as Mulheres.
Mas se nestes dois países a situação é crítica, no Mali a conjuntura é de guerra aberta entre uma certa legitimidade (não constitucional) e um déspota terrorismo. E porquê uma legitimidade não constitucional e um terrorismo? Recordemos a evolução.
O Mali, em Março de 2012, foi alvo de um Coup d’État (Golpe de Estado) levado a efeito por militares liderada pelo capitão Amadou Haya Sanogo (estranhamente e ao contrário das directrizes da União Africana (UA), esta reconheceu o novo Governo). Este golpe despoletou a crise subsequente levada a efeito por tuaregues e aproveitada pelos islamitas pró-al-Qaeda.
Os tuaregues liderados pelo Movimento Nacional para a Libertação d’ Azawad (MNLA), um movimento laico que também agrupa islamitas não radicais defendeu a separação autonómica do Norte do Mali (Azawad) no que foi aproveitado por radicais islâmicos para declararem a secessão integral e respectiva independência do território.
Só que os independentistas não se ficaram pelo território secessionado. Quiseram progredir para sul o que levou o presidente interino, Dioncounda Traoré, ao abrigo da Resolução 2085 da ONU, sobre o Mali, solicitar ajuda à Comunidade internacional, leia-se, à França e à UA.
Recorde-se que Traoré ascendeu ao poder através de um novo Golpe contra Sanogo, evocando a retomada da legitimidade constitucional. Nada mais erróneo dado que desde 2002 que o Mali era governado por golpistas.
A aproximação dos golpistas terminou em Konna – na região de Mopti, que já não faz parte de Azawad –, a cerca de 300 quilómetros a norte da capital, Bamako, com a entrada na cena militar de forças francesas.
E aqui volta a velha questão da franconização de África que o presidente francês Hollande disse ter terminado.
É certo que a “Operação “Serval”, assim definida pelas forças franco-malianas, visa, unicamente, a restauração do domínio maliano sob todo o país. É certo que esta operação militar tem o apoio da UA e estará enquadrado pelo apoio das forças africanas da Afisma, (força africana de cerca de 3470 soldados da CEDEAO) que os malianos – e os franceses – continuam a aguardar pela sua chegada ao teatro das operações.
É certo, igualmente, que quando terminar a operação militar haverá que consolidar o poder legislativo do Mali sobre Azawad onde os moderados desejam manter uma certa autonomia atestada pelo facto da UA estar a aceitar a secessão de alguns Estados recordemos Etiópia-Eritreia e o Sudão).
Mas o problema estará não na estabilidade política do Mali mas de toda uma região onde os islamitas radicais procuram fomentar o desenvolvimento de movimentações pró-Sharia (Lei Islâmica), nomeadamente em Marrocos, Argélia, Líbia e Egipto.
Porque uma Azawad independente poderia shatterilizar toda a região houve a intervenção militar francesa. Não esqueçamos que apesar do eventual fim da franconização de África há sempre na mente dos líderes a máxima que os “Estados não têm amigos nem inimigos mas interesses a defender” e os da França foram sempre os maiores e permanentes…
E, depois, há sempre a necessidade de salvaguardar a defesa da integridade territorial de alguns Estados como Marrocos, Costa do Marfim, Líbia e Nigéria os principais visados, imediatos, de um preocupante avanço islamita. E quem diz estes, pode dizer, Moçambique, África do Sul e subindo pelo Atlântico – e fecha-se o anel, e fecha-se o Rimland condicionando África e os dois Oceanos…
©Artigo de Opinião publicado no semanário angolano Novo Jornal, secção “1º Caderno” ed. 263, de 1-Fevereiro-2013, pág. 19.

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